POR DENTRO - O Funeral e as Verdades

O Funeral e as Verdades

A garota de pele morena, seu rosto no formato de coração, cabelos negros e cacheados, seus fios ondulados estavam no mesmo tom do céu a fora, brilhoso como a lua. Seus olhos escuros brilhavam ao ver a mãe dançando no palco daquele teatro. Ela não estava maravilhada somente pela mãe dançando, estava encantada com todo o conjunto de dançarinos que a acompanhava nos passos leves. A dança contemporânea a cativava fazia com que ela quisesse se levantar da cadeira da primeira fileira e ir dançar junto à mãe. Todos que a assistiam elogiava a beleza de seus passos leves, com o final da apresentação o público se levantou e aplaudiu a exuberância de seu talento.

Kler abre os olhos acordando de um sonho, mais uma lembrança da noite anterior. Ele ficou surpresa de ter conseguido dormir. Sentando na cama ela ouviu três batidas na porta e logo disse que estava aberta. Seu pai, um Senhor moreno de cabelos grisalhos entrou no quarto com um vestido preto pendurado em um cabide que ele segurava na mão esquerda.
__ Bom dia, minha linda garotinha – disse ele meio rouco.
Seu pai gostaria de disfarçar o verdadeiro desespero que estava dentro dele, mas seu rosto inchado e os olhos vermelhos não escondiam o que ele havia feito a noite toda.
__ Não sei – ela fez uma pausa para limpar o rosto das lagrimas que começaram a escorrer de seus olhos – eu não quero fazer isso, pai.
__ Eu sinto muito, Kler. Mas temos que fazer isso.
Ele se aproxima e abraça Kler que fica de joelhos na cama para alcançar o abraço do pai.
Seu pai saiu do quarto e ela relutou para sair da cama e se vestir. O funeral de sua mãe estava marcado para ás dez horas da manhã, mas ela gostaria que aquele horário nunca tivesse sido marcado.
Se nada tivesse acontecido na noite anterior ela estaria sentada à mesa tomando um café da manhã observando o sorriso de sua mãe como ela fazia todas as manhãs.
Kler caminhou lentamente até o banheiro e se despiu tomando uma ducha fria para acordar. Ela terminou o banho se enrolando em um roupão de inverno vermelho. Voltou para o quarto observando o vestido com detalhes de renda nas mangas, o vestido era todo preto para o funeral.

A mãe de Kler tinha cinco irmãos, estes cinco mais o pai de Kler carregavam o caixão em tons de marrom pelo cemitério. Kler escutava muitos ‘vai ficar tudo bem’, ‘deus queria isso, minha filha’, ‘ela está em um lugar melhor agora’, ‘ficaremos sempre dispostos quando precisar’. Nenhum desses comentários a ajudou muito. Ela deu um breve sorriso ao ver seus amigos Ryan, Nico, Shirley, Pamela, Ronan e Stefan próximos ao local da sepultura. Fernanda estava ao lado de Nico.
Nico a abraçou primeiro em silencio, considerando o que ela já tinha ouvido antes esta era a melhor coisa a se fazer. Ryan foi o próximo dizendo para ela que sentia muito, ele até chorou depois de tentar não fazer isso enquanto segurava a mão de Stefan.
__ Me desculpa – ele voltou aos braços de Stefan que escondeu seu rosto já que Ryan não gostava de chorar na frente das pessoas.
Pâmela apenas a deu a mão em um cumprimento, Pâmela acreditava que os mortos não deveriam ser enterrados, já que em sua religião era ensinado que do pó viestes para o pó voltarás.
Shirley não segurou sua pose de roqueira durona quando abraçou Kler, ela chorou como uma garotinha que acabara de perder sua boneca preferida.
Depois de muitos abraços e palavras de consolo seguido por lagrimas chegou a vez de Fernanda de cumprimentar Kler. Por alguns segundos ela hesitou em um abraço prolongado, mas acabou apertando um pouco mais os braços envolta de Kler.
__ Eu já perdi minha mãe, não a conheci. Você teve esse privilégio, não será a pior coisa, mas você tem que ser forte para superar – disse Fernanda no ouvido de Kler durante o abraço.
O funeral seguiu com uma palavra do pastor da igreja que Kler frequentava aos domingos, ele disse que todos têm um trajeto a seguir na vida, que alguns terminam quando outros ainda seguem o seu. Mas que o importante foi que a mãe de Kler cumpriu o dela e que agora estava perante ao trono de Deus dançando para ele.

NICO – RYAN, EU NÃO SEI O QUE TE FIZ PARA VOCÊ NÃO TER FALADO COMIGO NO FUNERAL DA MÃE DA KLER, MAS SE TE FIZ ALGUMA COISA, PEÇO DESCULPAS.
RYAN – ME ENCOTRA EM CASA, PRECISO FALAR COM VOCÊ.

Nico estacionou o carro na frente da casa de Ryan, ele ficou observando a porta da casa do outro lado da rua, no fundo ela sabia muito bem que o que aconteceu quando Ryan passou a noite em sua casa era errado. Ele tinha plena convicção disso.

NICO – ESTOU AQUI.

Alguns segundos depois a posta da frente se abriu e Ryan saiu por ela se aproximando do carro, Nico abriu a porta para ele entrar e Ryan se sentou ao seu lado.
__ Há quanto tempo somos amigos? – Perguntou Ryan sem dar voltas na conversa.
Nico olhou em seus olhos tentando pensar na resposta.
__ Não sei faz tanto tempo, acho que nos conhecemos na maternidade.
__ Exato, então por isso você é meu melhor amigo e preciso saber a sua opinião.
Ryan leva a mão até o bolso da bermuda vermelha que estava vestindo. Ele mostra o anel de noivado que Stefan lhe deu.
__ Você ia casar e nem me falou nada? – Nico disse fitando a mão de Ryan.
__ Eu não sei, porque você me deixou confuso. Ainda está me deixando com este olhar de quem vai chorar a qualquer momento.
Sim esse era o olhar de Nico, seus olhos estavam cheios de lagrimas.
__ Não, eu não vou – Nico limpou os olhos com suas poucas lagrimas – eu não devia ter feito aquilo, na quinta feira e nem no sábado. É que a Fernanda colocou tantas coisas na minha cabeça...
__ O que? – Disse Ryan interrompendo-o – Você me beijou porque a vadia da sua namorada colocou coisas na sua cabeça?
__ Ryan – ele fez uma pausa para pensar nas palavras certas – Ela me disse que você sempre foi apaixonado por mim. Fiquei com aquilo na cabeça, me lembrei que uma vez você me disse que para saber se a pessoa gosta mesmo de você é só a beijar, se ela continuar é por que gosta.
__ Não cabia a mim.
__ Eu sei.
Ryan fechou os olhos e abriu a porta para sair do carro.
__ Eu vou me casar com o Stefan assim que me formar, vou morar na Califórnia com ele – ele fez uma pausa – E talvez a Fernanda é insegura comigo a seu respeito por que ela te trai todos os dias com um vendedor de drogas.
Ryan saiu do carro e começou a caminhar pela sua.
Nico ficou em silencio. Ele não queria acreditar nas palavras que seu melhor amigo acabará de dizer.

Josias o jovem mecânico tinha olhos verdes e um corpo musculoso, as maças de seu rosto pareciam ser lapidadas por tamanha perfeição que ela marcava em sua face. Quando ele sorria dois pequenos furinhos se formavam em suas bochechas. Mas não foi só por aquilo que Fernanda se apaixonou em sua ida para Florida na última semana, era essa pose que ele tinha. O olhar sedutor o sorriso puxando para o canto do rosto. E quando ela se levantou da cama vestindo apenas suas roupas intimas em um tom vinho ela deu a volta no cara observando como suas costas eram largas e seus braços musculosos. O cabelo cortado recentemente puxado para o lado com o outro lado bem aparado.
Ela esticou os braços passando-os envolta do corpo de Josias acariciando seu peitoril com as mãos levemente massageando. Ele tentou virar o rosto para beija-la, mas assim que tal movimento percebido por Fernanda ela recuou do beijou empurrando sobre a cama fazendo cair de barriga para baixo.
Josias se virou encarando-a. Fernanda não contente desatou seu cinto de couro que prendia a calça jeans escura com alguns rasgos na altura dos joelhos.  Fernanda se debruçou mordiscando os mamilos de Josias que gemeu com a rápida e excitante abocanhada que a garota deu em sua pele branca.
Ele a toma em seus braços fortes deitando-a, ele queria estar no controle da safada que conheceu enquanto passeava com os cachorros da avó. Josias estava á viajem na Florida, a mãe ficou doente e ele teve de ir visita-la, deixou o chefe furioso com as duas semanas de ausência. Fora o trabalho como mecânico próximo ao nada luxuoso apartamento alugado ele fazia alguns bicos e um deles era vender drogas para os adolescentes. Sabemos que existem muitos adolescentes que estão no rumo acadêmico usuários de drogas. E Josias tinha a faixa etária perfeita para passear e vender drogas nos corredores dos colégios.
Fernanda sabia muito bem no que estava se metendo, pois já havia cheirado uma carreira de substancias que a deixaria exausta no dia seguinte. Mas agora o que ela queria mesmo era transar com ele até amanhecer – ou o efeito da droga passar.
Nico estava em pé olhando pela janela de seu quarto antes de sua mãe entrar para acorda-lo. Ele olhou para trás assim que ela abriu a porta sem saber. Ele gritou algo sobre estar pelado – o que era fato – e correu para fechar a porta. Nico estava se masturbando tentando olhar a vizinha que sempre andava pelada pelo quarto de grandes janelas na casa da frente. Ele tentava manter a regra de fazer isso todas as manhãs de aula. A mulher era casada, algumas vezes ele via o marido sem roupas correndo atrás dela como um pique-pega muito infantil cheio de risos no rosto e era neste exato momento que começou a acontecer. Ele descansou a mão coçando a cabeça de cabelos escuros que caiam até os ombros.
Ele olhou a hora no visor do smartphone e percebeu estar atrasado para o primeiro tempo. Correu para o banheiro terminando o serviço que estava fazendo no quarto. Tomou um banho rápido e voltou se enxugando em uma toalha grande vermelha.
Nico era o tipo de garoto do ensino médio bem organizado, ou pelo mesmo tentava mantar as aparências, se ele arrumasse o quarto ganhava uma quantia em dinheiro de sua mãe, normalmente ele pegaria essa quantia para comprar o lanche na escola, mas ele estava juntando dinheiro para comprar um carro.
Todo adolescente homem na idade dele já dirigia, mas Nico fez questão de bater o carro da mãe entrando no estacionamento do supermercado, e sua punição era comprar o próprio carro.
Já vestido e pronto para ir à escola ele abriu a porta do quarto e desceu até a sala. Sua mãe levantou a mão lhe entregando o dinheiro para o lanche. Ele o pegou saindo pela porta vestindo sua jaqueta de frio.
Estava acabando o ano e com isso o frio estava chegando. Ele só estava se prevenindo.
Roman, seu amigo que começou a lhe dar carona para escola, estacionou o carro assim que ele fechou a porta atrás de si. Ele entrou dentro do carro e eles aceleraram para a escola.

Kler estava abatida ainda com a morte da mãe, o seu pai insistiu que a morena ficasse aquele dia em casa, mas era as últimas semanas e as provas finais, ela não queria perder. Vendo que seus amigos, Pâmela, Nico, Ryan e Fernanda estavam sentando embaixo da mesma arvore se sempre ela se aproximou arrumando a mochila nas costas.
__ Bom dia – disse ela com a voz baixa, todos responderam, mas o clima não estava muito bom.
Kler percebeu os olhares que Nico trocava com Ryan e o quanto que Fernanda a encarava a estava assustando.
__ Como você está? – Perguntou Ryan finalmente desviando os olhos de Nico que olhou para Kler no mesmo instante.
__ Melhor que ontem, esperando melhorar hoje para ficar ainda melhor para amanhã – Kler sorriu sem parecer forçada pelo momento – Foi o que meu pai disse para responder quando não estiver bem.
Fernanda se levantou e abraçou Kler deixando que todos os olhos da rodinha se voltasse para ela. Kler tentou se conter, mas estava frágil demais para afasta-la por orgulho, então apenas a abraçou forte.
__ Eu sinto muito, Kler – Fernanda pressionou um lábio ao outro e se soltou da morena que se mostrou com os olhos cheios de lagrima.
Ryan se levantou para abraçar Stefan que acabará de chegar. Nico sorriu quando o namorado do seu suposto melhor amigo o cumprimentou com um acenar da mão direita.
__ Tenho que ir, o treinador me ligou dizendo que precisava fazer comigo – disse ele depois de dar um breve beijo na boca de Ryan – Não se esqueça do jantar hoje – Stefan sorriu e se afastando gritou – em casa as dezenove horas.
Alguns ruídos percorreram enquanto o silencio ainda prevalecia.
__ Vou me casar – disse empolgado informando os outros amigos enquanto saltitava na grama verde – Ele chamou meus pais para formalizar o pedido.
Fernanda arqueou as sobrancelhas com um enorme sorriso no rosto olhando para Nico que se levantou rapidamente.
__ Vamos, Kler eu te acompanho – ele segurou a mão de Kler puxando-a para mais perto e a abraçou enquanto andavam entrando no prédio.
__ Você mereceu, vadia – disse Ryan com ar de deboche para Fernanda que de uma hora para outra havia transformado seu sorriso em uma cara fechada e vermelha de raiva.
Ryan caminhou entrando no prédio do colégio.
Ele caminhou até seu armário e viu Nico encostado nele, respirou fundo e continuou até chegar mais próximo.
__ Olá, Nicolas – disse ele com um sorriso desesperador no rosto.
__ Você não me disse nada sobre o jantar, demorou para me contar sobre o noivado, o que está acontecendo com você, Ryan?
Ryan girou a tranca de um lado para o outro colocando o segredo do armário e o abriu ele estava tentando ignorar Nico que não o deixava ser ignorado.
__ Sabe que somos amigos, você é meu melhor amigo, por que está me tratando tão diferente? É por causa do beijo?
__ Que beijo? – Perguntou Fernanda surpreendendo os dois que a fitaram assustados.
__ Linda, estamos conversando, é tipo particular, sai vadia – disse Ryan.
Ele pegou o livro de Biologia e fechou o armário.
__ Ele é meu namorado, e não temos nenhum segredo para guardar um do outro – disse Fernanda sorrindo e olhando para Ryan que sorriu de volta.
Mas na verdade ele estava com vontade de saltar no pescoço dela.
__ Verdade, você não esconde nada do Nico? – Ryan sorriu fechando seu armário. Ele foi para sua primeira aula.
Fernanda olhou para Nico desmanchando o belo sorriso em seu rosto, ele a fitou como se quisesse examina-la.
__ Vou para a aula – Disse Nico caminhando pelo corredor.

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