Correntes Secretas - Marcarado (Parte I)


Mascarado

Encarei a figura mascarada na minha frente, não conseguia ver seus olhos por traz da máscara prateada, ele estendeu a mão com uma luva preta como a capa com fundo vermelho para um cumprimento educado.
Apertei sua mão e abri espaço para que ele entrasse.
O mascarado passou ao meu lado em silencio, movimentando-se de forma calma, como se estivesse atento a todos os detalhes, por menor que ele fosse.
Estava ansioso, não sabia exatamente o que esperar daquele jantar, fechei a porta e o encarei enquanto ele tirava a capa preta de suas costas. Ele a entregou para mim, vi Jeferson se aproximando e lhe entreguei para que guardasse.
– Você tem um nome? – Perguntei e arranhei a garganta assim que ele se virou para me olhar com a profundidade da máscara prateada.
Não via nada de sua pele, por mais que ele tivesse tirado a capa o capuz ainda estava ali, tapando qualquer vestígio de pele que pudesse aparecer a meus olhos.
– Você tem uma bela casa – ele disse apenas, revelando o que ele tinha de humano, a voz grave e quase cantarolada – devesse ter um belo jardim nos fundos.
– Você deve saber que sim – disse deduzindo que ele investigou de entrar ali, se eles fossem tudo o que Lúcio disse, provavelmente ensaiaram cada passo que dariam ali dentro, ainda mais que Iris Gabriela conhece bem a mansão.
Dei um passo à sua frente tomando o caminho até a porta de vidro que leva a área da piscina que estava toda iluminada dando visão ao jardim com caminhos feitos por arbustos bem aparados.
– Você parece estar com pressa – disse o homem me seguindo com passos leves quase como se flutuasse – entendo o porquê de estar assim.
Parei antes de sair para o jardim por outra porta a minha direita e o encarei bem de frente. Ele claramente era mais alto do que eu.
– Você tem um nome? – Perguntei novamente, agora encarando o pequeno brilho que conseguia ver na profundidade dos olhos da máscara.
– Pode me chamar de Christian – ele desviou passando na minha frente e abriu a porta para o jardim – conheço o caminho – ele disse segurando a porta para que eu passasse.
Mesmo com aquela mascara, ele parecia confiante, a sua forma de andar, seus passos firmes, é impossível descreve-lo, ele era obscuro, mas de certa forma podia trazer um certo conforto.
– Qual é a verdadeira intenção nesta visita? – Perguntei assim que passamos pelo primeiro poste de luz no extenso jardim.
– Veja bem, você foi convidado a ir até nossa residência – ele começou e viramos entre o corredor de oliveiras – não vejo motivos para não me convidar a sua casa, você possui um pelo jardim.
Ele parou e encarou a figura de uma gárgula iluminada por uma luz fixa aos seus pés.
– Há uma lenda mitológica que diz que haviam gárgulas antigamente, elas andavam pela escuridão protegendo e se alimentando de seus protegidos – não conseguia tirar os olhos dele, mesmo que não visse o movimento de seus lábios, tentava imagina-lo, tentava enxergar qualquer que fosse a forma de vê-lo – dizem que se você quebrar uma ao meio haverá sangue junto ao entulho – ele se virou para me encarar me assustando – adoro mitologia.
Sorri nervoso, meu coração estava acelerado, ele voltou a caminhas na minha frente, suas mãos juntas em suas costas, ele tinha um equilíbrio, como se nem pisasse no chão, como se estivesse apenas flutuando.
– Não gosto muito de mitologia, mas há bons contos sobre – não quis transparecer meu nervosismo – me diga, o que devo esperar da minha visita a Seita?
Ele virou novamente, agora caminhávamos em direção a casa, sentido ao quarto de hospedes.
– Encare como uma experiência positiva, apenas uma noite naquele lugar custaria uma fortuna, mas dinheiro não é o problema para você – ele fez silencio, como se estivesse pensando em um próximo passo a ser dado - sexta-feira será a noite dos cavaleiros mascarados, todos estarão usando máscaras, achamos conveniente para o dia de sua visita, não queremos constranger ninguém com a sua chegada, você verá a verdade, naturalidade no ato sexual e o resto é por sua conta, não gosto de criar expectativas.
Estávamos finalmente no deque de frente a porta para a sala de jantar, Jeferson se aproximou e abriu a porta para que entrássemos.
A mesa estava posta, para um grande banquete.
– Por favor, sente-se – disse educadamente puxando a cadeira para Christian, o mascarado.
Ele sentou-se e eu me juntei sentando-me na cabeceira da mesa, ao seu lado.
O primeiro serviçal passou pela porta da cozinha empurrando com ele um carrinho a La Carte.
O mordomo então se aproxima e serve a entrada, sopa sem sólidos, colocando os pratos sobre a mesa. Logo os dois desaparecem pela porta da cozinha.
– Você não vai comer? – Disse Christian virando para me encarar após perceber que passados alguns segundos eu ainda não havia tocado na sopa.
Sorri com entusiasmo, o que passou pela minha cabeça tinha tudo para dar certo.
– Perdoe-me pelos meus modos, mas estou esperando você começar a refeição – sorri novamente, desta vez com certa ironia – porque prepararia tão banquete se não para a sua visita?
– Tenho certas limitações, por isso, agradeço, mas não irei me regozijar do jantar.
Ele estava se recusando, tão educado, formidável, movimentos bem pensados, tinha apenas que ser rápido o bastante.
– Sim, mas podemos resolver isso – em um movimento rápido e menos calculado do que que havia pensado saltei em sua direção arrancando de seu rosto a máscara, ele se jogou no chão escondendo sua face com as mãos e logo em seguida com a escuridão de seu capuz.
Sua máscara estava na minha mão, e eu a segurava com raiva, estava furioso, e precisava explodir, alguma hora isso iria acontecer.
Estava cansado de seguir esses joguinhos de controle.
A luz da sala de jantar se apagou por completo e logo a mansão toda estava sob a escuridão total, olhei em direção ao jardim e uma luz no fundo dele piscou.
– Você achou que era imprevisível – escutei Christian, o mascarado, sussurrar no meu ouvido, ele estava perto o suficiente para que eu sentisse seu hálito quente no meu pescoço –, mas você não é, estamos sempre um passo na sua frente...
– Fábio? – Escutei Jeferson gritar e interromper o mascarado então as luzes se acenderam de uma só vez.
Estava petrificado, senti como se todo o meu sangue tivesse sido drenado, vi Jeferson se aproximar rapidamente, e os outros funcionários surgirem aos poucos.
– O que é isto na sua mão? – Perguntou Jeferson com um olhar apavorado em seu rosto.

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